quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Floresta

A névoa densa deixava o bosque branco. Tudo era muito fresco. A copa do carvalho, muito frondoso, misturava-se às outras árvores.
A luz entrava suavemente, sem agredir nenhum ser vivo. Sem interferir no fluxo do orvalho.
O acúmulo da garoa que caiu durante a noite fazia com que as folhas pendessem preguiçosamente.
O som silencioso dos seus cascos só podia ser ouvido pelos seres muito pequenos, pois o resto da floresta ainda dormia.
Desfilou por entre os antigos carvalhos, sentindo o ar gelado do início do dia passar por entre os fios da crina incrivelmente branca.
Postou-se ao lado da maior árvore do bosque. Diferente de todas as outras árvores, a ramada dessa entidade eram enormes flores e não folhagem.
A gigante vestia-se com pétalas de cores translúcidas que, ao serem penetradas pelos raios do sol, refletiam no chão um vitral.
O pelo claro do unicórnio refletia todas as cores. Achava-se numa calma ímpar, repousando sob a proteção da mãe da floresta.
O ar tinha um feitiço etéreo e claramente traços de um não-lugar. Uma não-superfície-terrestre.
Um espaço fora do espaço, com um céu recoberto de luas gigantes, tão próximas que ao esticar os braços a distância entre as pontas dos dedos e a superfície alva do astro se tornava mínima.
As cores desse terreno eram suaves.
Cada ser-vivo que brotava do chão tinha contornos difusos e reflexos harmoniosos, dando ainda mais a impressão de que se caminha em um tempo onírico.
Ouve-se, baixinho, a vida que habita em árvores milenares, pedras espaciais e solo fértil.
Milhares de vidas tecendo uma melodia de passos miúdos e bater de asas expressivo.
Uma joaninha escala a aste de um gerânio e oberva.
Uma libélula sobrevoa um jardim de violetas.
Uma lagartixa risonha move a cauda lentamente.
Uma formação de nuvens no alto de uma montanha cresce, ganhando dimensões extraordinárias.
O unicórnio repousa, uma joaninha orbserva, uma libélula lambe violetas, uma lagartixa sorri.
A floresta ganha aos poucos uma sombra magistral. Mansa.
A organização de cinzas no céu carrega vida e dissoluções.
As luas se viram de lado, retirando um pouco da sua beleza de prata para descanso.
Uma trovoada ressoa dentro do sonho e um dilúvio quimérico se joga do precipício.
Cristais vítreos despencam do céu e encharcam.
Todas as possibilidades se tornam paupáveis e tudo fica inebriado de acaso.
Os sentidos se aguçam e a tempestade realiza seu espetáculo.
Os seres não são espectadores ociosos. Participam.
Constroem a teia de divagações, ilusões, num terreno de não-lugar.
Onde os vitrais refletidos no chão são pétalas de flores, unicórnios flutuam entre carvalhos e uma joaninha observa.
Os satélites naturais são astros possíveis de se tocar. Tudo é muito fresco e a névoa densa deixa o bosque branco.

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