terça-feira, 23 de novembro de 2010

Azul e vermelho cintilantes

Tudo no túnel entre o piso de madeira e o interior da cama é estático.
Nem uma brisa consegue penetrar as janelas de vidro e assoprar os papéis ou limpar a poeira que se instalou naquela caverna escura.
Nem um raio de luz adquire permissão pra desfazer aquele escuro frio. Tudo tem uma coloração desbotada e rude. E é pesado.
Cada objeto que estacionou naquele antro tem o aspecto de chumbo.
Debaixo de cama, misturado a papéis amassados, rascunhos de cartas, um cinzero e bicas de cigarro tem uma caixa, revestida de tecido azul e vermelho cintilantes.
As cores vibram, mesmo envoltas em poeira e teias de aranha. Como um coração pulsando.
Todo o universo habitado embaixo da cama não se passa no tempo. Fica ali pra sempre, do jeito que chegou. O ar não corre, as sombras não se movem, a luz não modifica.
Como um vacuo instalado. Um silêncio arrebatador.
A caixa vermelha e azul brilhando no fundo da cama irradia uma energia etérea.
Se algo pudesse se mover e se aproximar da caixa, sentiria uma força suave e delicada como um véu, mas com a potência de um imã, sugando seu corpo para junto dela.
Nada se move, nada conhece a autoridade desempenhada pela caixa debaixo da cama.
Se algo ou alguém conseguisse esticar o braço e tocar no tecido reluzente sentiria um ímpeto incontrolável de abrir a caixa.
Os olhos que a mirassem, não importa a coloração, refletiriam o interior do objeto deflorado.
Qualquer sentimento seria inundado pela essência que brotaria de dentro do recipiente.
Semi-aberto, tomando todo o cuidado pra que a substância não se perca, não evapore de maneira efêmera, como se todo aquele universo pudesse ser sugado por um buraco negro,
admira-se o que o tecido azul e vermelho cintilantes escondem.
Incrível. Absolutamente sublime.
Se alguma coisa, mesmo que por um milésimo de segundo, pudesse mover-se no interior daquela caverna escura e aproximar-se da caixa, um mundo de possibilidades estaria prestes a explodir.
Se ao menos por um momento, algo deslizasse, ou friccionasse um milímetro.
Nada se move. Nem mesmo o vento. Nem mesmo as sombras.

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