sábado, 6 de novembro de 2010

Enquanto existe a possibilidade de dar-se conta do que está na frente, fecham-se os olhos.
Se houver, ainda, a chance de se escutar o que tem pra ser dito, tampam-se os ouvidos.
Numa chuva fantasmagórica ouve-se uma risada distante.

O medo faz com que se queira correr pra qualquer direção, mas os galhos finos das árvores prendem-se na malha fina da roupa e na superfície da pele.
Arranham de leve e a tez branca ganha riscos vermelho vivo.
Rasga-se o vestido para limpar o ferimento, mas friccionar o pano sobre o corte arde até couro cabeludo. Apalpar os braços e coxas de maneira suave parece ser a solução.
Agora a ameaça da chuva reverte o ciclo.
As nuvens escuras deixam o céu arroxeado e os contornos das coisas vão se perdendo.
Abrem-se os olhos na espera da menor captação de imagem.
Aguçam-se os ouvidos para qualquer ruído.
Silêncio e escuridão.
Agarra-se às raízes das árvores. Estas, fortes, firmes no chão. Observa as nuvens formarem bombas que estouram e fazem seu corpo todo se contrair a cada estrondo.
As raízes resistentes garantem certa segurança. Unir-se a elas até virar um só talvez seja o caminho.
Cristais arredondados caem do céu incessantemente, como uma cortina translúcida que finge deixar ver as coisas.

Molha-se, resfria o corpo. Sabe que se largar os troncos das árvores a chuva vai arrastá-la. Não conseguirá parar, pela força da água. Então, tendo em vista o seu medo e a sua fragilidade, vai soltando vagarosamente, dedo após dedo, suas mãos da árvore.
Rola correnteza abaixo, num rio de leite. Sente os cabelos revirados, embolados. Bolhas correndo pelo rosto, colando nos cílios e entrando no nariz.
Os olhos piscando num leito de chuva. Enquanto o medo não vai embora, sente um frio na barriga e abre bem os braços.
Reconhece as duas emoções: vertigem e liberdade.
Sorri, confusa. Vira peixe e engole o rio. Abre as pernas e abraça a lua.

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